Enquanto isso no blog ao lado...

terça-feira, 29 de abril de 2008

Dourado

Tem um leitor assíduo que às vezes me deixa envergonhada, às vezes me deixa convencida, às vezes até me emociona! Mas sei que gosto de cada visita que ele faz a este lugarzinho meu e que, agora, resolvi mostrar para o mundo...

Foi dele que recebi o meu primeiro selo!



Muitíssimo obrigada pelo presente, pela presença e pela força, Dourado!

Indico o selo para o blog Esse é bom!, da Dona Bruna Bites...

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Vácuo

Agonia, medo, sono, ansiedade, saudade, solidão
No vazio das horas, são estas as minhas companhias
Com elas converso sobre o nada
Crio uma lógica inexistente e incompleta
Penso na insignificância de tudo
Sinto as palavras querendo explodir ao primeiro piscar de olhos
Até a noite se cala
Para que as coisas possam fazer menos sentido
E os sentidos percebam o abstrato

sexta-feira, 25 de abril de 2008

Seres invisíveis

Estou aqui ajoelhada no chão limpando uma privada que eu não tenho permissão de usar. Trabalho há mais de dez anos em uma universidade federal e, durante todo esse tempo, nunca me senti melhor do que qualquer sujeira que eu limpo diariamente.

Em um lugar público, onde teoricamente estariam ricos e pobres, mas só aqueles que têm dinheiro conseguem freqüentar, conheço o rosto de várias pessoas. Alguns estudam aqui, outros estudaram e hoje são professores, mas todos eles passam por mim como se eu fosse parte da mobília, uma coisa inanimada que sempre esteve ali, mas não é importante.

Aliás, a minha existência só é notada em casos extremos. Ontem não vim trabalhar, estava no enterro de minha mãe. Só percebi que sentiram a minha falta quando, no corredor, uma aluna falou que o banheiro estava um nojo, mas nem isto foi falado para mim, foi para outra pessoa, como se eu não pudesse escutar.

Conto cada minuto que estou aqui dentro como um exercício de sobrevivência. Espero as horas de pausa para estar com outros que sentem a mesma coisa que eu, mas também não podem fazer nada para mudar a sua invisibilidade.

Antes, pensava que se fosse um cachorro vagando pelo campus, receberia mais afeto do que recebo hoje, mas agora tenho, lá no fundo do meu peito, uma esperança: minha filha está estudando muito e sonha em entrar para esta universidade. Tenho certeza que, a partir deste dia, pelo menos uma pessoa vai me olhar nos olhos, saber o meu nome e me cumprimentar.

Porque "No País das Ritalinas"

Vária pessoas já me perguntaram porque o meu blog se chama No País das Ritalinas. Como percebi que esta é uma dúvida comum, resolvi explicar aqui a escolha do nome.

Eu tenho um transtorno muito conhecido atualmente, o TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade). Por causa dele sou uma pessoa muito impulsiva e desatenta e não sou muito boa em tarefas de arrumação e, muito menos, em finalizar as coisas que começo.

Como hoje em dia para tudo existe remédio, criaram um medicamento para melhorar a vida das pessoas que têm este mesmo problema, a Ritalina.

Um dos efeitos colaterais da droga, em mim, é que a criatividade, que já sobra aqui dentro, aumenta e eu penso em escrever o tempo todo, sem parar. As histórias vão se formando em minha mente sem eu nem perceber e a vontade de falar sobre tudo que vejo também aumenta muito. Por isso resolvi virar blogueira, para colocar para fora essa quantidade enorme de coisas e não ocupar tanto espaço em minhas prateleiras. Aqui, procuro falar das coisas que invento, mas ainda tenho um pouco de vergonha. No meu outro blog, Cenas de Cinema, falo dos filmes que assisto e, como estou falando da criação dos outros, não fico tão tímida.

Então é isso, conviver com o transtorno não é fácil. Mas agora tudo está muito mais calmo e minha vida parece mais organizada. Na verdade, é como se hoje eu estivesse entrado em um outro mundo, por isso, peguei emprestado o título do clássico de Lewis Carroll. E aqui estou eu: Cecilia no País das Ritalinas.

terça-feira, 22 de abril de 2008

Cadê o sentimento?

Neste mundo louco, ninguém mais parece saber o que é viver em sociedade. Cada um se preocupa consigo e o resto que se vire. Não existe mais aquela conversa no portão, aquela amizade entre vizinhos. Falta até amor de pai, amor de mãe, amor de filho. De repente estamos em um mundo que não estamos preparados para enfrentar e, talvez por isso, preferimos fechar os olhos aos acontecimentos, aos outros seres humanos e recheamos nossas vidas com coisas pequenas e antes insignificantes.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Walter

Walter era um menino lindo. Alto, cabelos negros e com um olhar tão profundo como o de Capitu. Vivia calado e, onde quer que estivesse, estava com a mãe ao seu lado.

Na pequena cidade onde moravam, todos acreditavam que era mudo, menos a jovem Alice, colega de escola desde a primeira infância, que jurava a quem quisesse ouvir que já ouvira a voz de Walter.

Provar que o rapaz falava virou um dos objetivos de Alice. No começo Walter não percebia, mas ela estava em todos os lugares que ele estava. Enquanto para ela, tudo não passava de uma pesquisa, para ele as coisas iam tomando outras proporções. Só pensava nela, não via a hora de sair de casa e encontrá-la. Arrumava-se todo, perfumava-se e não queria mais ficar em casa. Há muito, a paixão crescente não era discreta e Alice resolveu que se aproveitaria dela para provar que ele falava sim.

A mãe de Walter também notou a mudança de comportamento do filho e resolveu que já não mais sairia com ele. Em um desses dias, Alice viu a senhora entrando em um mercado local sem o filho e não perdeu tempo, pegou sua bicicleta e foi para a casa deles.

A alegria do menino ao chegar para abrir a porta foi algo sem limites. Ele gesticulava freneticamente, arrumava o sofá, parecia beber alguma coisa sem ter nada nas mãos. Eram tantos gestos, que Alice sentiu-se meio tonta. Ela segurou-o pelos ombros, olhou no fundo de seus olhos, pediu calma e começou a falar:

- Eu notei que você gosta de mim. É verdade?

Walter, eufórico, respondeu que sim com a cabeça.

- E você quer namorar comigo? - Ela disse.

Novamente, apenas um aceno de cabeça.

- Eu te dou um beijo, mas só se você falar que me ama.

Após ouvir estas palavras, a expressão de Walter era de choque. Queria beijá-la mais do que tudo na vida. Ao mesmo tempo lembrava de sua mãe falando que nunca, jamais, sob hipótese alguma, deveria falar. Seus olhos encheram-se de lágrimas, mas Alice continuava insensível:

- Vamos, fala! É só para mim. Prometo que não conto para ninguém.

O menino ainda fez que não com a cabeça e tentou desviar o olhar, mas ela segurou em seu rosto e disse com um olhar de desapontamento:

- Se você não falar, eu vou embora, e nunca mais, nunca mais, eu chego perto de você.

Walter não conseguia nem descrever o que estava sentindo. Parecia não ter mais estômago e suas pernas estavam muito bambas. Sabia que não podia falar, mas não queria ficar sem Alice. Abraçou-a e, antes que pudesse pensar melhor, olhou-a nos olhos, abriu a boca e mugiu.

O susto da menina foi algo sobrenatural. Ela fugiu do abraço como um sabonete escorrega nas mãos ensaboadas. Olhava para Walter sem acreditar no que ouvira e aproximava a cabeça do ombro tentando ver se assim entendia, ou se desentupia o ouvido.

Ele nem notou que ela estava assim. Estava desesperado e, tentando explicar o que acontecera, mugiu novamente.

Mais um susto e Alice começou a caminhar lentamente para trás. Walter não queria que ela fosse embora, queria explicar, queria ficar com ela, queria o beijo que prometera. Caiu de joelho no chão e agarrou-a pelas pernas chorando e mugindo sem parar.

A menina queria sair dali, mas não conseguia mover-se. Sentia muito medo, mas, ao mesmo tempo, tinha pena dele.

De repente, a porta se abriu e a mãe de Walter entrou assustada. Ouviu o filho mugindo loucamente ao chegar perto da porta. Há muitos anos ele não fazia isso. Mas o sentimento de desespero não era nada perto do que ela sentira ao se deparar com a cena. A menina chata que vivia atrás de seu filho em pé e Walter agarrado em suas pernas chorando e mugindo em desespero.

Ela ainda tentou perguntar o que Alice estava fazendo ali, mas a única coisa que se podia ouvir na sala eram os mugidos. Estavam todos desesperados e foi Alice quem resolveu a situação. Passando por cima de todo o terror que estava sentindo, acariciou a cabeça de Walter e pegou em seus ombros. Os mugidos foram espaçando, até sumirem completamente.

Walter foi largando as pernas de Alice até deitar-se no chão. A menina ainda se ajoelhou ao seu lado e, com lágrimas nos olhos, pediu desculpa por fazê-lo passar por tudo aquilo. Deu um beijo em seu rosto e ajudou-o a se levantar e sentar no sofá.

A mãe ainda estava parada no mesmo lugar e assistia a tudo sem falar nada e nem se mover, tentava pensar no que faria, no que diria para a menina depois que tudo aquilo acabasse, ela iria querer saber.

Mas ela já sabia de tudo, com a calmaria e o silêncio, as coisas começaram a fazer sentido em sua cabeça. Beijou novamente o rosto de Walter e disse em seu ouvido:

- Eu vou embora agora, mas volto logo.

O menino, mais uma vez, apenas acenou com a cabeça, olhou-a nos olhos e tentou sorrir. Antes que a mãe conseguisse pensar em algo para falar, Alice virou as costas, abriu a porta e foi embora.

Pedalando rápido, com o vento batendo em seu rosto, lembrava de tudo que havia acontecido. Lembrou-se também de uma conversa que teve com o pai e na qual nunca acreditara. Uma vez, em uma reunião de família, ele comentara que, há muitos anos, buscando a cura de doenças graves, começaram a produzir embriões mistos de seres humanos e bovinos. Com o tempo, ficou proibida a morte destes embriões e alguns cresceram e se desenvolveram. Sabia-se que o novo ser era, na verdade, 99% humano e 1% bovino, mas ninguém sabia o que, na verdade, era diferente. O que era o 1%. Alice descobrira hoje.

Futebol é assim!

A gente gasta tanta energia torcendo, mas se alguma coisa sai errada, se alguém não acerta o pênalti, se o juiz é um doido, ou se o nosso time está nervoso demais, não tem mais jeito mesmo.

Aí é sentar quietinho no canto, beijar a camisa, esperar o próximo jogo, cumprimentar todos os alvinegros que vir pela frente e ignorar as chatices dos flamenguistas, que parecem habitar o mundo só para isso: atazanar!

domingo, 20 de abril de 2008

MEME: Os melhores e piores da estante

A Nane, do blog Utopia de Emily, mandou um meme para o meu outro blog, o Cenas de Cinema. Adorei a idéia, mas como o assunto tem mais a ver com o Ritalinas, resolvi respondê-lo por aqui. Nem sei se posso fazer isso, mas lá vai:

Para começar, tenho que indicar os cinco melhores autores da minha estante:
  • Machado de Assis: em primeiríssimo lugar e isolado. O melhor de todos os tempos e em qualquer língua. Tem uma narrativa fantástica e sabe como abordar qualquer assunto usando sutileza, mas sem deixar de ser irônico. Um mestre!
  • William Shakespeare: se alguém quer ler algo sobre as várias faces de um ser humano, eis a melhor opção. Apesar do inglês arcaico, não há como não gostar!
  • Edgar Alan Poe: para quem gosta de contos de mistério e terror. Ele influenciou um monte de gente que faz muito sucesso até hoje e soube como escrever histórias que parecem nunca ficar antigas.
  • Ruy Castro: o meu favorito para biografias. Quando começo a ler um livro dele, tenho muita dificuldade de parar.
  • Carlos Drummond de Andrade: adoro suas poesias, que falam de coisas cotidianas e corriqueiras de uma maneira encantadora.
Para finalizar, tenho que indicar um autor que jamais deveria ter publicado um livro e esta tarefa é muito mais fácil do que a anterior:
  • Paulo Coelho: apesar de ser adorado por todos, não vejo sentido em tanto sucesso. Não gosto de nada nos livros dele.

Então é isso! Agora tenho que indicar o meme a outros amigos blogueiros. Os escolhidos foram:

sábado, 12 de abril de 2008

Shakespeare e o amor

"Senhorita, deixastes-me privado do uso da fala. O sangue, tão somente de minhas veias, é que vos responde."
(O Mercador de Veneza)

"Tudo me gira em torno. A expectativa me faz sentir vertigens.
O deleite imaginário é de tal modo doce
Que me encanta os sentidos."
(Trólio e Cressida)

"Porque todos os amantes se comportam como eu:
Inconstantes e volúveis em todos os sentimentos,
Menos na imagem fixa
de criatura que amam."
(Noite de Reis)

"O amor, de fato, é só à primeira vista"
(Como Gostais)

"O amor não vê com os olhos, mas com a mente;
E por isso é alado, e cego, e tão potente"
(Sonho de uma Noite de Verão)

"Parece abril, com seus incertos dias,
o amor primaveril, sempre mudável,
que ora o sol patenteia, resplendente,
ora em nuvem se esconde, impenetrável"
(Os Dois Cavaleiros de Verona)

"Assim por teu amor ou bem por tua imagem,
Ausente, sempre estás presente junto a mim.
Segue-te meu pensar por longe que viajes
E com ele estou eu, como ele está comigo."
(Soneto 47)

"Duvida da luz dos astros,
De que o sol tenha calor,
Duvida até da verdade,
Mas confia em meu amor"
(Hamlet)

"O amor é fumaça formada pelos vapores dos suspiros.
Purificado, é um fogo chispeante nos olhos dos amantes.
Contrariado, um mar alimentado pelas lágrimas dos amantes.
Que mais ainda? Loucura prudentíssima,
fel que nos abafa, doçura que nos salva"
(Romeu e Julieta)


E é assim: quando falta a criatividade, vem a citação...

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Quarto Escuro

Em um quarto escuro encontro pessoas perdidas

“Você?! O que quer aqui? Por que agora?”

Gente importante, gente insignificante

Aquela pessoa especial

Aquele cara chato

Cada um com a sua bagagem

Com a sua história

Reconheço os olhos tristes daqueles que magoei

E o rosto sereno dos que precisaram de mim

O pai, os filhos

O irmão, os vizinhos

E, aqui desse lado, você

Mas você também está ali

E acolá, e ali atrás, e mais adiante

Onipresente e constante

Com tantos olhares

Com tantos sorrisos

domingo, 6 de abril de 2008

Covardia

Covardia é esperar acabar sabendo que você pode fazer ou dizer algo, que você pode se levantar e andar. Se cuidar, se curar, se permitir...

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Paciência

Pensei em pagar uma fortuna por um retiro espiritual, em uma outra cidade, tentando buscar a minha paciência, que resolvera sumir dentro de mim.

Mas para que gastar esse dinheiro se preciso encontrá-la agora, para tentar comprar a passagem?

Odeio promoções de passagens aéreas!

Círculo vicioso

Aí, ela olhou no fundo dos olhos dele e disse:

- Não quero mais!

Ele ainda fez sinal de que falaria alguma coisa, mas ela se levantou, ajeitou a bolsa no ombro, virou de costas e foi embora.

Na verdade, ela achou que não conseguiria. Não era a primeira vez que tentava. E ele sempre fazia com que seu pensamento mudasse. Prometia mudar umas vezes, comprava flores em outras, mas sempre que ela prestava atenção novamente, já queria dizer isso para ele de novo.

O dia inteiro pensou em como faria para resistira àquele olhar. Resolveu então que iria no trabalho dele, pois lá ele não saberia o que fazer, não correria atrás dela, não choraria. Treinou umas 25 vezes na frente do espelho e foi.

Chegou lá sentindo que seu coração sairia pela boca, até os seus joelhos pareciam tremer. Entrou na sala e lá estava ele, lindo. Será que ela devia mesmo terminar? Antes que ele se levantasse ela sentou em sua frente.

Ele demorara a falar, como se estivesse prevendo algo. Mas, com uma fisionomia assustada perguntou se tudo estava bem.

A voz dele a fez abaixar os olhos por pouco tempo. Ao fitá-lo novamente sentiu mais uma vez aquela pontinha de dúvida, mas um filme rápido se formou em sua mente. Ele gritando, falando coisas que ela já não agüentava ouvir, a falta de assunto, o pouco caso, todos os desgostos e mágoas jogados para baixo do tapete.

Foi o suficiente. Ela endireitou-se na cadeira, olhou no fundo dos olhos dele e disse:

- Não quero mais!

Ele ainda fez sinal de que falaria alguma coisa, mas ela se levantou, ajeitou a bolsa no ombro, virou de costas e foi embora.

terça-feira, 1 de abril de 2008

Engarrafamento

Calor insuportável. Parece que a direção, o painel e até o carro vão escorrer ali, bem na minha mão. O sol faz a gente ter a sensação de que o asfalto está derretendo e evaporando assim, a olhos vistos.

A fila de carros na minha frente é inacreditável, assim como a que está atrás de mim e a que está ao meu lado. O som do carro está ligado num volume que normalmente me deixaria irritadíssimo, mas com o ar condicionado ligado no máximo e com essa sinfonia desafinada de buzinas descoordenadas não tinha mesmo muito jeito.

Lá de longe vejo o menino vendedor de balinhas. Ele as pendura apressadamente nos retrovisores dos carros. Ninguém nem olha, tirando aquela senhora gorda que já comprou tudo que passou por ela.

Ao meu lado, um menino de no máximo 20 anos canta alegremente com as janelas do carro meio abaixadas e com fones de ouvido. Como ele está agüentando o calor sem um ar condicionado? Como é que pode ele estar assim cantando? Como é que alguém pode ficar feliz num engarrafamento?

Me sinto irritado com a alegria desta criatura e acho que olho demais pra ele. Ele está me olhando de volta. Fico envergonhado por ter sido pego em flagrante, sentindo um misto de raiva e inveja dentro de mim. O rapaz, por sua vez, sorri pra mim. Aquilo é como um tapa na cara, mas eu tento me controlar e olho para baixo.

Merda! A minha calça está com uma mancha branca. Que diabos foi isso? Só pode ser pasta de dente. Pego o primeiro papel que alcanço e esfrego com força na calça pra ver se pelo menos disfarço. Secretamente, penso que estou esfregando a o sorriso na cara do cara ao lado, tentando apagá-lo.

O menino das balas chega até o meu carro, mal chega e já vai. Agora só vou vê-lo quando ele voltar recolhendo. Acho que esse não é aquele de sempre. Será que aconteceu alguma coisa com o outro? Há dois anos vejo esses meninos aqui e sequer sei o nome deles.

Por que as rádios têm tanto falatório? Se eu quisesse ouvir alguém falando, deixaria na CBN. Aliás, vou fazer isso. Pelo menos assim ninguém grita no meu ouvido que eu posso comprar isso ou aquilo em infinitas prestações.

Lá vem o menino recolhendo as balinhas. Olho pra ele e faço que não com a cabeça. Descubro que é o mesmo, mas com o cabelo cortado. Isso, de algum jeito me alivia.

O cara ao lado parece ter trocado de música. Agora só cantarola sem se movimentar tanto. Não era possível mesmo que aquela empolgação durasse pra sempre. Ainda mais aqui. Ainda mais agora.

Penso no quanto eu sou ridículo por me sentir melhor ao ver que meu vizinho de engarrafamento não está mais feliz. Além de estar estressado quero que todos se estressem também. Isso me deixa bastante envergonhado.

Olho para o rapaz, que olha novamente pra mim. Sorrio pra ele e ele me olha com a testa franzida, como se eu o tivesse paquerando ou algo do tipo. A vontade que eu tenho é de gritar que não é nada disso. Que só quero que ele fique feliz de novo. É lógico que não faço isso, mas ele vira a cara e parece que não pretende sorrir e nem me olhar nunca mais.

Graças a Deus o carro começa a andar, mas logo depois para de novo. Pelo menos um alívio: o meu vizinho de engarrafamento é outro. E está bem nervoso!
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