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quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Aniversário de Casamento

Espero a chegada dele com ansiedade. Não quero sentar pra não amassar o meu vestido, não quero ficar em pé pra não machucar os meus pés com o salto alto. Quando penso em quantas horas eu fiquei me preparando pra esse encontro, percebo o quanto ele é importante pra mim e o quanto eu me sinto bem fazendo isso por ele.

O cabelo está mais curto, sofri na depilação por horas, gastei uma grana com um conjuntinho novo de calcinha e sutiã e retirei a maquiagem toda por duas vezes por não achar que a cor da sombra estivesse boa. O que será que ele vai achar de tudo isso?

Acho que exagerei um pouco no perfume, só consigo sentir o cheiro dele. O Márcio odeia quando eu passo perfume demais. Será que eu deveria tomar uma ducha pra amenizar a situação? Mas só faltam dois minutos para a hora que nós combinamos. De repente se eu me lavasse rapidinho. Só mesmo uma água no corpo.

Tiro o vestido na sala mesmo e o coloco com todo carinho em cima do sofá, corro pro banheiro só de lingerie e nem me preocupo em regular a temperatura da água. Claro que está gelada e eu tento não morrer congelada enquanto salvo a escova do cabelo. Mas dá tudo certo.

Saio, me enxugo rapidamente, coloco novamente a calcinha e o sutiã e volto pra sala, onde o vestido me aguarda bem quietinho. Depois de pronta novamente percebo que o cheiro do perfume parece estar agora pior do que antes, meio estranho, como se tivesse sido lavado. Corro pro banheiro e coloco só um pouco nos pulsos, o suficiente pro corpo inteiro.

Resolvo não calçar o sapato. Assim é mais fácil ficar em pé. Mas se o Márcio chega e me pega descalça vai passar uma hora falando que nunca o espero pronta. Resolvo, então, deixar o par bem perto de onde estou pra que nenhuma briga aconteça.

Olho pro relógio e dois minutos já passaram da hora marcada. Se fosse eu, escutaria um monte de bobagens. Mas pra que ficar comparando. É o nosso aniversário de casamento. Depois de 12 anos já não vale mais a pena ficar brigando por qualquer coisa.

Sento para esperá-lo e penso em telefonar, mas controlo a minha vontade, mesmo com o telefone olhando pra mim daquele jeito. De repente seria bom beber uma taça de vinho, já que ele não chega. Mas o meu hálito não ficaria muito agradável depois de um vinho.

Sem ter o que fazer e pra não enlouquecer enquanto o espero, pego meus sapatos e vou para o quarto de tv. Odeio esse sofá, parece que ele vai engolir a gente. Sento e ligo a televisão. Está passando o jornal, mas eu não sei porque prestar atenção em tanta desgraça. Fico ali olhando e pensando nas muitas coisas que eu tenho que fazer com as crianças no dia seguinte. Será que elas estão bem?

Pego o telefone e ligo pra casa da minha mãe. Ela atende como se tivesse acabado de correr uma maratona. “Tudo bem por aí, mãe?”, “ele tem que colocar o aparelho”, “amanhã eu te conto tudo”, “beijos e boa noite”.

Desligo o telefone e penso novamente em ligar pro Márcio. Mas não, não vale a pena. Olho pro relógio e, apesar de parecer uma eternidade, parece que o tempo não andou. Fiz tudo isso em dois minutos? Será possível?

Ele sempre faz isso comigo, eu me arrumo toda e nada dele aparecer. Deve ter encontrado algum amigo e resolveu esticar pra algum boteco do caminho. Provavelmente nem se deu conta de que hoje é o nosso aniversário de casamento. Já não quero mais fazer nada com ele.

Faço questão agora de deixar que o sofá me amarrote toda, já não estou mais sentada, deitei pra ver se pego no sono.

O trinco da porta faz um barulho. É ele. Idiota! Está cinco minutos atrasado. Vou fingir que estou dormindo e assim ele vai ver o quanto eu estou magoada com a sua falta de atenção.

Há exatos 12 anos eu agüento esse tipo de descaso, mas agora não vai mais ser assim. Esse foi o nosso último aniversário. Amanhã eu vou pra casa da minha mãe.

Os passos se aproximam da sala de tv. Tento controlar a respiração pra não demonstrar a minha revolta. Não quero falar com ele, não quero olhar para a cara dele. Enquanto sinto tanto ódio, ele passa a mão levemente em meu braço e sussurra em meu ouvido: “amorzinho?”.

Amorzinho?! Se fosse assim chegaria na hora, né?

Ele repete e eu abro os olhos fingindo que estava no melhor dos sonhos. Não falo nada. Na minha frente está o homem por quem eu me apaixonei e com quem eu resolvi que passaria o resto da minha vida toda. Em suas mãos um buquê de tulipas vermelhas, as minhas favoritas.

“Perdi a hora porque não achava a cor que você gostava, parecia que só tinham tulipas laranjas e amarelas nessa cidade. Ainda bem que encontrei essas. Era pra ser uma dúzia, mas lá só tinha essas oito.”

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